Dia 02.04 é o dia da conscientização do autismo, por isso resolvi escrever sobre o autismo e a psicanálise. O autismo é uma síndrome que
afeta a capacidade afetiva, a comunicação e a linguagem, e é considerado pela
neurologia e a psiquiatria de origens puramente orgânicas e genéticas. Foi
descrito pela primeira vez em 1943, pelo médico austríaco
Leo Kanner que definiu a síndrome como um quadro grave que atinge a criança por
volta dos dois anos de vida.
O autismo é considerado um transtorno global
do desenvolvimento marcado por três características fundamentais: inabilidade
de interagir socialmente, dificuldade no domínio da linguagem para comunicar-se
e padrão de comportamento restritivo e repetitivo.
O diagnóstico é feito por volta dos dois ou
três anos de idade e é essencialmente clínico, através dos sintomas e relatos
dos pais e da avaliação do comportamento da criança. Hoje já se sabe que os
sintomas podem aparecer nos primeiros meses de vida, mas infelizmente na
maioria dos casos não são identificados precocemente.
O autismo é há muito tempo objeto de estudo da
psicanálise, mas o que a psicanálise pode fazer diante de uma criança com esse
diagnóstico? Enquanto tratarmos a doença como puramente genética ou biológica
estamos fadados a pensar não há muito a fazer em relação a essa síndrome e os
próprios pais acabam perdendo as esperanças de melhora de seus filhos. Mas a
psicanálise trás um outro olhar sobre essa questão quando pensa o autismo, a partir de uma falha na linguagem, no campo
do simbólico, uma falência da operação significante, algo que acontece no
início da constituição psíquica do bebê.
Aprendemos com Alfredo Jerusalinsky, que o nascimento de um filho sadio não é
suficiente, apesar de sua integridade neurofisiológica, para garantir a
constituição nele de um sujeito psíquico. Em alguns casos quando essa
constituição está debilitada, ou muito precária, é necessário uma intervenção
que possibilite esse bebê a ter acesso ao mundo psíquico, ao simbólico e a
linguagem.
É muito comum em nossa cultura a idéia
de que crianças muito pequenas não podem apresentar sofrimento psíquico, porque
afinal quais problemas teriam um bebê? Mas se pensarmos que Sigmund Freud
atribuiu uma importância muito grande aos primeiros anos de vida porque é nesse
período aonde acontece toda a construção do aparelho psíquico.
Outra questão muito discutida na psicanálise
é: será que conseguimos prevenir o autismo?
O que hoje se sabe através de pesquisas é que podemos identificar alguns
sinais de riscos de desenvolvimento psíquico precocemente. Quando esses sinais
são descobertos a tempo, com apenas alguns meses de vida, pode-se fazer um
trabalho psíquico, através de uma intervenção precoce a fim de mudar o destino
dessa criança. Esses sinais são: o bebê não interage com a mãe, nem com o
ambiente, não responde aos chamados maternos, não olha nos olhos, não procura o
olhar da mãe, não diferencia o colo da mãe das outras pessoas e parece preferir
gostar de ficar sozinho.
Não se
pode acreditar que com o tempo o bebê vai apresentar melhoras, vai interagir
melhor ao ambiente, e que ainda é muito pequeno por isso não responde aos
chamados maternos. O tempo não cura ninguém, muito pelo contrário, nesses casos
é preciso haver um tratamento adequado
prontamente antes do diagnóstico de autismo, isto é, nos primeiros meses de
vida.
Infelizmente as pessoas não percebem os sinais
de riscos precoces e não estão preparadas para identificá-los logo no início.
Deve-se procurar por um tratamento quando aparecerem os primeiros sinais de
riscos de desenvolvimento psíquico e ele devem ser feito por um especialista
que trabalhe com bebês, porque muito pode ser feito por seu filho, ainda nos
primeiros meses de vida a fim de possibilitar para que essa criança tenha uma
nova direção quanto a sua constituição psíquica.
Receber um diagnóstico de autismo não é fácil
para os pais. Mas será que depois do diagnóstico nada pode ser feito? Será que
essa criança está fadada para sempre a essa condição psíquica? Não há nenhum
tratamento que possibilite uma melhora na vida dessa criança, adolescentes ou
adultos para que possam estabelecer laços sociais, ter acesso a linguagem e
serem sujeitos do desejo, que respondem por seus próprios nomes e vidas?
A Psicanálise nos
diz que sim, que há muito que se fazer e que o tratamento é longo, mas produz
bons resultados. Geralmente ele é feito
com a presença da mãe e do filho e trabalha o tempo todo unicamente com palavras.
Mas o que se pode esperar desse tratamento? O objetivo dele é produzir uma
mudança interna, sendo que essa mudança vai permitir melhorar a interação com o
meio em que vive, não é um tratamento focado na adaptação da criança ao
ambiente, mas sim na constituição do mundo psíquico.
Daniela Bittencourt – Psicóloga CRP
12/07184
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